11/12/10

AINDA O CENTRO INTREPRETATIVO NO MONTE DA FORCA






Ante-visão do Centro Interpretativo apresentado pelos autores


Centro Interpretativo no Forte da Forca
O nosso desacordo

Já noutras ocasiões nos pronunciámos sobre o projecto do Centro Interpretativo no Forte da Forca , em Torres Vedras. Neste blogue abordámos o assunto em 25 / 12 / 2009.

Hoje, ao lermos o que se escreve no site oficial do Bicentenário das Linhas de TV, da Câmara Municipal de T Vedras, mais nos convencemos da necessidade de repensar tal projecto.
Veja-se o que lá diz:

«Centro Interpretativo das Linhas de Torres Vedras
Forte da Forca


Trata-se de um projecto que a partir do conceito edifício-monumento, proporciona ao visitante um panorama global do período da Guerra Peninsular e, em concreto, do sistema defensivo construído para a defesa da capital, as Linhas de Torres Vedras.


Para além, do núcleo expositivo, que terá por base o espólio do Museu Municipal Leonel Trindade, este centro possuirá um forte conteúdo tecnológico. Terá ainda o mérito de requalificar todo o espaço interior do Forte da Forca


PROMOTOR: Câmara Municipal de Torres Vedras»

Discordamos por muitas razões.
Parece-nos pertinente transcrever aqui a posição da Associação do Património de T Vedras sobre este assunto, divulgada no início do corrente ano no jornal Badaladas e no blogue http://patrimoniodetorresvedras.blogspot.com/



O CENTRO INTERPRETATIVO DAS LINHAS DE TORRES
E A SUA LOCALIZAÇÃO

Sobre o projecto de um centro interpretativo das Linhas de Torres aprovado pela Câmara em Março de 2007, na zona norte da cidade, têm surgido neste jornal [Badaladas] vários artigos de opinião, questionando o processo seguido, e, sobretudo, a sua localização no morro da Forca.

Posições pertinentes, oriundas de gente abalizada, com provas dadas nos campos da reflexão político-cultural (Rui Matoso), do planeamento urbanístico (António João Bastos), da prática política (Jorge Ralha) e da historiografia (Henrique Vieira). São opiniões que, em qualquer circunstância, devem contar.

E são posições que, na sua generalidade, esta associação partilha.

SOBRE O PROCESSO

Desde o anúncio sensacionalista surgido na primeira página do Badaladas, ilustração de página inteira, que nos pareceu haver algo de errado neste processo. É consensual que em qualquer obra, primeiro estabelece-se o conteúdo e depois procura-se a forma. Ora, aqui dá-se o inverso: - é proposta uma forma exterior (um boneco) sem que nada se saiba sobre o programa museológico – que espólio se vai expor, que narrativa é que se vai contar, que aspectos vão ser acentuados, a que tipo de público se vai dirigir, que valências/funções vai contemplar, que meios tecnológicos se vão utilizar.
E, não menos importante, quem o vai fazer?
Falta, pois, o Guião para se fazer o Filme!

Sobre a atitude que subjaz a este procedimento, por parte dos autores, muito haveria certamente a questionar, desde logo o significado da “oferta” de um projecto deste tipo. Mas não é esse o objectivo deste texto, para já.

Trata-se, de qualquer modo, de um equipamento cultural que diz respeito à comunidade, que implica diferentes valências e deverá ser objecto de várias contribuições.

SOBRE A LOCALIZAÇÃO

Interessa-nos aqui focar essencialmente a questão do local, que constitui já por si um factor interpretativo, sobretudo quando está em causa uma realidade histórico-geográfica como foi o complexo de fortificações que travou o exército de Massena.

O REDUTO DA FORCA

O morro da Forca insere-se num dos espaços geográficos mais simbólicos do complexo defensivo das Linhas – o triângulo S.Vicente, Castelo, Forca – que defendia a estrada de Coimbra para Lisboa, às portas de Torres Vedras. Contém vestígios do que terá sido um reduto fortificado,

Nesse sentido, é um local elegível para o efeito

Encontra-se, no entanto, muito adulterado na forma que tinha à data dos acontecimentos. A sua configuração é apenas observável a partir de alguns relevos muito esbatidos no terreno. A escarpa a norte, outrora impressionante como barreira natural, encontra-se hoje muito alterada pelos cortes efectuados para a construção das vias ferroviária e rodoviária, assim como pela proximidade de equipamentos comerciais recentes, criando uma vizinhança incómoda, como muito pertinentemente referiu J. Ralha. Assim, o que seria relevante do ponto de vista interpretativo – a ideia de barreira – está largamente comprometido face à dificuldade de leitura da actual configuração e ao ruído do aparato comercial.

Por outro lado, como refere A.J. Bastos, existem incompatibilidades com o PDM, a nível dos índices de construção previstos para a área – verde ecológico urbano – que implicam uma baixa percentagem da área de construção.

Movidos pela curiosidade deste argumento, quisemos certificar-nos da disponibilidade do espaço existente.

E, in loco, percebe-se claramente que o espaço disponível é insuficiente para receber um equipamento desta natureza, o qual supõe acessos fáceis, parques de estacionamento para ligeiros e autocarros, etc. O cimo do morro ficou reduzido a uma magra faixa de terreno, depois do corte efectuado para a construção de uma superfície comercial.

Fica-se, pois, com a sensação de que quem projectou e quem aprovou não conhecia bem a área.

Percebe-se, no entanto, a tentação que levou à sua escolha: - Se, como acima se referiu, a sua encosta norte está descaracterizada, impossibilitando uma leitura da estratégia militar de defesa, é certo que a vista de sul (desde o centro da cidade) está desimpedida e a implantação do edifício no alto do morro criaria um forte impacto visual, criando uma referência urbana positiva. Além de que a forma proposta garantia uma forte visibilidade, suscitando alguma curiosidade no habitante e no visitante.

Para quem elege a cultura-espectáculo até se percebe…!


O FORTE DE S. VICENTE

Se o objectivo é dar a conhecer as Linhas de Torres há que procurar como é que a geografia e o património construído nos permitem, ainda hoje, perceber o modo como se tentou obstar ao avanço das forças invasoras. Isto implica desde logo dois modos de abordagem: - uma visão de proximidade sobre os elementos que pontuavam as ditas linhas – os fortes, que nos fornecem elementos sobre as estratégias de defesa e combate; e uma visão de conjunto ou de largo alcance sobre o conjunto de elevações, que desde Torres Vedras se podem enxergar, e nos permitem perceber o próprio conceito de “linhas defensivas”.

Só depois, haverá que recorrer a outros auxiliares – museológicos, didácticos – para completar o quadro perceptivo dos acontecimentos – os mapas, o armamento, as fardas, as gravuras da época, a narração dos factos, os dados quantitativos, e outros elementos – que são tarefa do tal Centro Interpretativo. Com mais ou menos informática!

Ora, existe um local de eleição para fazer tudo isto – o Forte de S. Vicente!
O estado de conservação das suas estruturas e a sua altitude respondem aos dois primeiros requisitos que acima referimos, permitindo a observação de um dos mais importantes locais de aquartelamento e proporcionando uma ampla visão sobre uma parte considerável das linhas, para leste e para oeste. Dali divisa-se toda a cidade, o rio Sizandro, o Varatojo, o Monte da Archeira, a Serra do Socorro, o Sobral de Monte Agraço, etc.)
Quem sobe ao monte de S. Vicente percebe o essencial das Linhas!
Por outro lado existe nas proximidades um outro Reduto, em bom estado de conservação – o Forte dos Olheiros.

Existem acessos – e espaço para outros – bem como terreno disponível nas imediações, capazes de suportar uma edificação com suas áreas de apoio envolventes Estamos a pensar na encosta sul do monte, em local aprazível, de boa visibilidade desde a cidade e da circular poente - aspecto importante para o projecto e desfrutando de panorâmica grandiosa sobre a cidade e paisagem em redor.

É legítimo, pois, concluir que este é o local mais significativo e mais apropriado para receber um Centro Interpretativo das Linhas de Torres.
Isto se o conhecimento da História for o objectivo primeiro!

Janeiro de 2010 A Direcção da ADDPCTV


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Acrescentamos agora:


1. Um Centro Interpretativo deve ser isso, E SÓ! Deve ajudar a ver, interpretar os dados, transmitir conhecimento, ajudar a preservar memórias. Deve ser discreto, porque ao serviço de algo.
No entanto o projecto de que se fala aparece como uma imagem,é um fim em si, serve para marcar a paisagem, agiganta-se nela em detrimento do que devia servir.
Qual o projecto museológico inerente? Que públicos serve? Que ligação com as escolas e associações culturais? Que programas de divulgação? Nada se diz sobre isto.
De caminho faz-se referência ao espólio do Museu Municipal - que todos sabemos que é escasso, cabe numa sala... - e acrescenta-se um "forte conteúdo tecnológico", essa "Santa da Ladeira" que cauciona tudo e que compensaria a pobreza do resto.
Quer dizer: o edifício aparece e depois mete-se algo lá dentro, para lhe dar utilidade. Quando o contrário é que estaria certo...

2. O conceito de "edifício-monumento" é uma bela ideia para encher o olho e esvaziar os cofres da autarquia. Todos sabemos em que deu este conceito nas várias experiências por esse país fora, a começar na Casa da Música do Porto, passando pelos belos Estádios de Futebol do Euro 2004, agora às moscas. Custos astronómicos na construção, custos de manutenção incomportáveis. É isto que interessa a Torres Vedras?
Não somos contra uma arquitectura de qualidade que marque o nosso tempo. Mas a arquitectura, quando de encomenda pública, deve estar ao serviço de um contexto sócio-cultural bem definido, participado e respeitador dos meios financeiros disponíveis.
Ora, nada disso se verifica com o presente projecto: oferecido (oferecido!) ao Município por um  ateliê de arquitectos, sem contributos conhecidos e sem ter em conta os severos constrangimentos financeiros actuais e futuros.

3. O projecto apresenta-se com "o mérito de requalificar todo o espaço interior do Forte da Forca" Quem isto escreveu conhece bem o lugar?  O Forte da Forca é uma estrutura auxiliar dos dois Fortes dominantes (S. Vicente e Olheiros), sobranceira à estrada, de pequena dimensão e já muito degradada. Basta lá ir e ver. A chamada "praça de armas" é  um espaço reduzido, apertado entre um fosso escavado na rocha, a norte, e uma ravina natural mas já alterada pela construção da Linha de Caminho de Ferro e pela "passagem superior", a sul. Lá dentro não há espaço para construção nenhuma nem passaria pela cabeça de ninguém construir algo no interior para o requalificar.
Se há lugar para a construção de um edifício é "nas traseiras" do Forte, mas de novo é preciso lá ir para perceber como o espaço é acanhado,  apertado entre uma feia ravina escavada recentemente no lado poente, destinada a ancaixar mais um hiper-mercado,  e a encosta natural do lado nascente.
Sim, poderá construir-se um pequeno edifício, mas onde caberão os acessos amplos e os necessários parques de estacionamento para automóveis e autocarros?

Por tudo isto nos parece que este projecto não passa disso mesmo. Não conseguimos lobrigar qualquer articulação entre o que se projecta e a realidade em que devia concretizar-se.
Os seus autores sabem-no bem, estamos certos. Fizeram um belo exercício de arquitectura - já premiado em diversas instâncias, ao que sabemos. Mas do exercício à prática vai a distância que a vida real impõe.


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