29/11/09

BADALADAS - TEXTO 42 - 27 NOVEMBRO 2009

MEMÓRIA DO BRIGADEIRO NEVES COSTA


Joaquim Moedas Duarte


No discurso do Presidente da República, Cavaco Silva, proferido em Torres Vedras no dia 11 de Novembro, na cerimónia da abertura oficial das Comemorações dos 200 anos das Linhas de Torres Vedras, encontramos esta passagem:

«Na cidade que deu nome a esta obra maior de um povo em armas, aproveito para trazer à memória a figura de um grande português.
Recordo um cartógrafo militar de primeira água, que foi vítima de muitas injustiças, e, porventura, da maior de todas: a do esquecimento.
José Maria das Neves Costa foi o oficial do Real Corpo de Engenheiros que procedeu ao levantamento cartográfico em que assentou a decisão, há precisamente duzentos anos, de edificar em tão curto espaço de tempo uma fortificação com aspecto tão imponente e dissuasor. Honremos a sua memória.»

Quem foi Neves Costa?

A investigadora Maria Helena Dias faz um resumo da sua biografia:

«Oficial do Real Corpo de Engenheiros, José Maria das Neves Costa nasceu em Carnide a 5 de Agosto de 1774 e morreu em Lisboa em 1841, provavelmente a 19 de Outubro. Formado na Academia de Fortificação, Artilharia e Desenho (1793-1796), após os preparatórios na Academia de Marinha (1791-1793), foi premiado e considerado um dos melhores alunos do seu tempo. Engenheiro militar ilustre, destacou-se pelos seus brilhantes e inovadores trabalhos em prol da Cartografia militar, em particular nos levantamentos topográficos e na configuração dos terrenos, para além de ter sido um hábil desenhador. A sua vastíssima actividade neste campo desenvolveu-se durante mais de 40 anos e, apesar de constantemente referida a sua acção ao longo de todo o século XIX, cairia depois no mais injusto esquecimento.»

Sir Arthur Wellesley, futuro duque de Wellington, esteve na região de Torres Vedras em Outubro de 1809, e percorreu a cavalo toda a zona envolvente, procurando estabelecer um plano de construção de linhas defensivas. Dessa observação resultou o memorando que entregou aos seus engenheiros, e a partir do qual se iniciou a construção das fortificações. Wellesley retomava uma velha ideia que já outros militares portugueses haviam defendido e que se baseava na verificação de que a defesa da capital portuguesa apenas teria viabilidade a partir de um conjunto de fortificações situadas a Norte de Lisboa. Junot, na 1ª invasão, pensou o mesmo e mandou fazer estudos preparatórios ao coronel Vincent. E este acabou por se basear no trabalho de dois engenheiros portugueses, Xavier de Brito e Neves Costa.

Com a saída de Junot na sequência da Convenção de Sintra, os trabalhos destes dois engenheiros foram interrompidos. Tempos depois, perante a ineficácia de uma comissão encarregada de os completar, Neves Costa inicia sozinho e com escassos meios, o trabalho de levantamento topográfico da região norte da península de Lisboa, o qual viria a ser a base da planificação traçada pelos engenheiros ingleses para a construção das Linhas de Torres Vedras. Wellington menosprezou a qualidade deste trabalho mas a observação dos documentos que chegaram até nós permite-nos concluir que ele foi decisivo. A atitude grosseira do ilustre general inglês parece ter pesado na injustiça a que foi sujeito Neves Costa, que se reflectiu na progressão da sua carreira militar e respectivos proventos.

É-nos muito difícil imaginar hoje as condições em que Neves Costa trabalhou. Não havia estradas, apenas caminhos pedregosos e veredas lamacentas por onde se transitava a cavalo ou a pé. Fazer o levantamento topográfico de uma área de centenas de quilómetros quadrados, em apenas dois meses e em tão difíceis condições foi uma tarefa hercúlea que nunca foi devidamente reconhecida. Nem quando, alguns anos depois, Neves Costa fez uma longa exposição ao Rei, no intuito de garantir melhor sustento da família. Para tal também terá contribuído a sua acção como deputado e a nomeação para Ministro da Guerra pelo governo liberal, pouco antes da restauração absolutista. Morreu amargurado, aos 67 anos de idade e repousa no cemitério dos Prazeres, em Lisboa.

Deixou uma importante obra no campo da topografia militar, que só nos nossos dias mereceu reconhecimento público com a sua elevação a patrono do Instituto Geográfico do Exército, em 2005.



Para mais informação, ver o opúsculo de Maria Helena Dias, Brigadeiro José Maria das Neves Costa, 1774-1841: patrono do Instituto Geográfico do Exército. [Lisboa]: Instituto Geográfico do Exército, 2005. 16 p.

1 comentário:

Maria Helena Dias disse...

Se achar que o merece, pode estabelecer uma ligação ao sítio da "Ciência em Portugal" do Instituto Camões (http://cvc.instituto-camoes.pt/conhecer/bases-tematicas/ciencia-em-portugal.html), onde em Personagens se encontra um resumo da actividade de Neves Costa e ainda algumas imagens, incluindo a esquecida carta da região de Lisboa