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24/08/10

BADALADAS - Texto 55 - 27 AGOSTO 2010




 
FAZ HOJE 200 ANOS
ALMEIDA RENDE-SE À TRAGÉDIA


 

Joaquim Moedas Duarte


 
Almeida foi sempre a praça-forte mais avançada na resistência aos invasores. Na raia beirã, fronteira leste com Espanha, por aqui fazia entrada quem vinha sem licença e à força. Os anais históricos lembram as correrias bélicas da primeira dinastia, as investidas castelhanas na crise da independência dos finais do século XIV, a Guerra da Restauração trezentos anos depois, os cercos da Guerra da Sucessão já no XVIII - embates permanentes da teimosia espanhola contra o irredutível vizinho. Entrado o século XIX, o velho baluarte tinha ainda uma dura prova a cumprir. Foi quando o exército napoleónico, comandado por Massena, irrompeu por ali, disposto a vergar finalmente a velha Lusitânia com uma terceira invasão.

Estava-se em Julho de 1810. O Grande Exército francês, composto por três Corpos num total de cerca de 65 000 homens, estava prestes a invadir Portugal. Mas foi necessário, primeiro, cercar e dominar Ciudad Rodrigo, para garantir as linhas de abastecimento e comunicação com França. Feito isso, aí temos o invasor a derramar-se pelas serranias raianas, ciente da necessidade de dominar a grande praça-forte de Almeida, fortaleza de grossos muros em forma de estrela, que dispunha de 5 000 homens e de um poderoso equipamento de 98 peças de artilharia. Era seu comandante o brigadeiro inglês Guilherme Cox, tendo como subalternos alguns oficiais portugueses.
Depois do primeiro embate junto à ponte do rio Côa, em que o general inglês Craufurd a custo salvou a sua Divisão Ligeira, mas com pesadíssimas baixas, (ver nosso artigo neste jornal, em 22 /01/2010), as operações militares vão centrar-se em redor de Almeida.
Os preparativos para o cerco foram demorados. Os terrenos eram rochosos para trincheiras, e impraticáveis as vias de acesso aos trens de artilharia. Nestes trabalhos demoraram os franceses mais de quinze dias. As tropas anglo-lusas não estavam muito longe dali mas o prudente general inglês que as comandava – Arthur Wellesley – optara pela estratégia de não dar combate directo, fiado na capacidade de resistência da praça-forte e receoso da força inimiga em campo aberto.
A história do cerco está feita e não cabe aqui deter-nos em pormenores. (1)
Recordemos apenas que Massena escolhe o dia 15 de Agosto, aniversário de Napoleão, para iniciar o ataque mas os bombardeamentos sucessivos não vergam a valentia dos sitiados. Sucedem-se dias e noites de pesadelo. Atacar, atacar sem piedade. Resistir, resistir até poder. O drama, porém, estava guardado para um acontecimento inesperado. Foi no dia 26 de Agosto de 1810. O paiol da pólvora, no castelo de Almeida, bem no interior da povoação-fortaleza, foi deixado aberto enquanto se procedia ao transporte dos barris. Estranha e nunca bem explicada imprudência. Relata o narrador das “Memórias”:

Às sete da tarde ouviu-se uma tremenda explosão. Duas bombas lançadas pela bataria n.° 4 tinham atingido o grande armazém do castelo, que continha 75 000 quilogramas de pólvora. Foi como uma erupção vulcânica; o terrapleno das muralhas adjacentes abriu fendas; muitos canhões saltaram das suas posições e caíram no fosso; grande parte das casas ficou destruída, sepultando 500 homens nos escombros. Che­garam a cair destroços nas nossas trincheiras, ferindo alguns homens. As fortificações da frente de ataque, porém, ficaram intactas, e só a cortina do castelo sofreu danos. Os soldados da guarnição que escaparam ao desastre corriam entre as ruínas como perdidos, e um violento incêndio vinha aumentar o horror da sua situação. O governa­dor mandou tocar a reunir e dirigiu-se à muralha, onde chegou fogo por suas próprias mãos às poucas peças que ainda lá se encontravam. As nossas batarias de morteiros e obuses bombardearam durante toda a noite.”

Foi este trágico acontecimento que quebrou a resistência de Almeida. Depois de novo ataque francês, a praça-forte capitulou em 27 de Agosto – faz hoje 200 anos! Estava aberto aos invasores o caminho para Celorico e Viseu.
Saldo terrível: calculam-se as baixas em 600 mortos e 3 400 feridos entre os sitiados e cerca de 60 mortos e 320 feridos entre os franceses.
Por que razão Wellington não socorreu Almeida? Os estrategas militares ainda hoje discutem a opção do general inglês. Os factos, contudo, parecem desmentir a acusação de fraqueza que lhe é feita por alguns. Wellington jogava pela certa e não arriscava a sobrevivência do exército inglês, mesmo que isso significasse sacrifícios acrescidos para a população portuguesa. Um mês depois, no Buçaco, provou a justeza das suas escolhas. De mais, ele sabia o que Massena ignorava: mais a sul esperavam-no as formidáveis Linhas de defesa de Torres Vedras.

(1)
Memórias de Massena, General Koch, Livros Horizonte, Lisboa, 2007
Guerra Peninsular – Novas Interpretações, Vários, Inst. Def. Nacional, Tribuna, Lisboa , 2005

15/01/10

BADALADAS - TEXTO Nº 45 - 22 JANEIRO 2010


A BATALHA DO CÔA

J. Moedas Duarte

Em Julho de 1809 Napoleão, vitorioso em Essling e Wagram, dominava a Áustria, a Prússia e tinha a Rússia sobre controlo. Considerou que estava na altura de se voltar para a Península Ibérica onde a aliança Luso-Britânica mantinha um foco de resistência. Ponderou vir, ele próprio, resolver o problema militar mas acabou por entregar a um dos seus mais eficientes generais, André Massena ( 1758-1817),  o comando do denominado “Exército de Portugal”, criado em 17 de Abril de 1810. Massena, gasto por muitas batalhas, aceitou contrariado esta missão e mais contrariado ficou com a atitude dos generais seus subordinados, invejosos por se sentirem preteridos. Para muitos autores, estas desconfianças mútuas explicam parte do fracasso de Massena nesta campanha militar.
A primeira acção dos franceses foi contra Ciudad Rodrigo, já muito próximo da fronteira portuguesa. Durante setenta e dois dias esta cidade resistiu heroicamente ao cerco mas acabou por se render face à superioridade do inimigo. Ultrapassado o obstáculo, Massena entra em Portugal em meados de Julho e prepara-se para neutralizar Almeida de modo a garantir linhas de abastecimento com a Espanha, dominada pelos franceses. Não tinha muita pressa pois recebera instruções de Napoleão para que a campanha em Portugal se desencadeasse em Setembro, «depois do tempo quente e sobretudo depois das colheitas». Wellington, ciente da sua inferioridade numérica - o exército francês tinha cerca de 65 000 homens – não acorrera em auxílio de Ciudad Rodrigo e evita agora o confronto directo. Conta com a capacidade de resistência da vila fortificada de Almeida, uma praça-forte construída em forma de estrela, segundo o modelo idealizado dois séculos antes pelo engenheiro francês Vauban, de modo a neutralizar os efeitos da artilharia atacante e a aumentar a capacidade da artilharia defensiva. A estratégia de Wellington assentava em três princípios: desertificação do território, com destruição dos víveres que não pudessem ser transportados para Sul pelo êxodo das populações; acção de guerrilha das milícias e ordenanças, tropas de segunda e terceira linhas formadas por camponeses mas enquadradas por oficiais britânicos; e manobras no terreno, do exército luso-britânico de primeira linha, de forma habilidosa, de modo a encontrar um lugar propício ao embate, em condições de superioridade táctica - o que veio a suceder no Buçaco, em 27 de Setembro. Subjacente a estes princípios estava o segredo das Linhas de Torres Vedras, em construção acelerada mas ainda incompletas. Era vital, por isso, atrasar o mais possível a marcha de Massena sobre Lisboa.


Ponte sobre o Côa





Memorial aos combatentes do Côa


O primeiro grande embate entre invasores e defensores estava reservado para as margens do Rio Côa, perto de Almeida. Deu-se entre uma parte do exército francês, comandada pelo general Ney e a Divisão Ligeira Luso-Britânica comandada pelo general Craufurd. Os testemunhos da época dão-nos conta de um embate terrível, em que as forças aliadas estiveram a ponto de serem completamente aniquiladas pela superioridade numérica do inimigo. Tudo se passou em redor de uma ponte granítica sobre o Côa, que ainda hoje podemos visitar, poucos quilómetros antes de Almeida, na qual foi construído um singelo memorial a recordar as centenas de combatentes que ali perderam a vida. Contrariando ordens do sempre prudente e astucioso duque de Wellington, Craufurd não se limitou a pequenas acções de reconhecimento e diversão táctica. Decidiu enfrentar os franceses, apesar de manobrar em terreno acidentado e declivoso. Só a valentia desesperada dos seus soldados e oficiais subalternos impediu o desastre total, conseguindo a retirada pela ponte para a margem oposta, em sucessivos combates de enorme violência.
O confronto seguinte vai dar-se em Almeida. Dele falaremos em próximo artigo.

20/05/09

BADALADAS - Texto 30 - 15 MAIO 2009





ALMEIDA E BUÇACO: NOTAS DE VIAGEM

Manuela Catarino

Ao despontar da manhã, o céu confirma as previsões meteorológicas e anuncia os primeiros dias radiosos de Maio. Abrem-se sorrisos na perspectiva de um início de viagem agradável, que se vai confirmando com o galgar da distância, estrada fora. Embaladas, pela cadência da condução segura, as pálpebras fecham-se, por momentos, esquecendo a paisagem que corre do outro lado do vidro. Quando se reabrem, na primeira paragem, a perspectiva de um rápido e energético cafezinho permite constatar que não foi um sonho: o sol brilha. Eis a primavera …
De regresso ao alcatrão, que a velocidade engole, vai-se sobrepondo a paisagem em mutação. A caminho de uma Beira interior, de feições bem marcadas pela pedra que se modela ao vento, às chuvas dos dias invernosos, e pela vegetação que vai ganhando coloridos primaveris, os olhos habituam-se a descobrir permanências e mudanças. Não se encontram grandes aglomerados populacionais e, de quando em vez, os pardieiros, ermos, em ruínas, pontuam o espaço outrora habitado. Nos céus, as asas de uma ave de rapina espraiam-se pelo azul sem nuvens. Sobre uma torre, aninham-se cegonhas. Manchas acastanhadas de bovinos jovens preguiçam por entre ervas que guardam os restos da fresca madrugada. Sucedem-se as placas de toponímia, e as peculiaridades de cada paisagem ressaltam no nome escolhido para designar o espaço em que se vive e as
águas que nele serpenteiam.



Sinal do progresso dos tempos, o viaduto transpõe distâncias e quase esconde a velha ponte. Uma paragem. Pelo caminho, ornado de vivos tons florísticos, despontam tufos de rosmaninho. Na ponte sobre o rio Côa, apenas se distinguem os murmúrios da água corrente. Poluída, é certo, mas longe do vermelho intenso que terá conhecido após os primeiros combates que ali ocorreram na terceira invasão francesa. Memória gravada em pedra, ali permanece em nome de sonhos, vidas, feitos militares, medos e perdas, que à escala humana não têm nação nem bandeira.
Recordados os episódios históricos, de novo à estrada, e “com alma até Almeida”!!!!!! A impressão que se tem quando se entra a porta de S. Francisco é esmagadora. A abóbada que se ergue sobre as cabeças dos transeuntes é sólida e transmite confiança, tanta quanto a necessidade de defesa contra os ataques dos invasores que teria de suportar. E, ao entrarmos no perímetro amuralhado e circularmos pelo antigo caminho de Ronda sentimo-nos atraídos pela magnífica paisagem envolvente, sem contudo podermos despegar os olhos daquela imensa conjugação de traveses, parapeitos, baluartes, revelins, trincheiras, guaritas, redutos e mais elementos necessários à arte militar que ainda ali se apresentam. Quase nos esquecemos que foi esta praça-forte a sentinela raiana que enfrentou invasões, exigindo-se-lhe o maior dos sacrifícios: deter por todo o tempo possível os exércitos de Massena, com ordens de entrar em Portugal e dominar Lisboa definitivamente. Só a violenta explosão, que no dia 26 de Agosto de 1810, deixou marcas indeléveis na memória, e nas pedras do castelo velho, acabou por lhe ditar a trágica rendição.
E o cair da tarde prenuncia-se nas sombras que se adensam. Altaneira, a cidade da Guarda, surge ante nossos olhos numa mistura de lenda e modernidade. É a serra que se impõe. Ares frios e secos, bons para um sono reparador.

Manhã soalheira e nós em direcção ao Buçaco. Imaginamos o calvário da marcha de milhares de homens a caminho da batalha. Há 200 anos eles passaram por aqui, por caminhos velhos e pedregosos, ravinas e outeiros, sempre a marchar, à fome e ao frio, sem saberem o seu destino. Mas o nosso autocarro é de turismo cultural, ironia tremenda da História. Queremos evocar, homenagear, reconhecer aqueles heróis. Apenas se fala de generais – Crowfurd, Wellesley, Massena, Ney, Reinier, Junot – mas o sangue que correu em 1810 era de milhares de anónimos, franceses obrigados a atacarem, portugueses e ingleses obrigados a defenderem. Ali está o Moinho de Moura, nas faldas do Buçaco, inscrição atestando ter sido ali o Posto de Comando de Massena.







Mais adiante o Moinho de Sula, posto de comando do inglês Crowfurd, que já se batera, semanas antes, na Ponte do Côa com a sua Divisão Ligeira. E a tradição do moleiro que teimou em subir para desfraldar as velas, pois para ele não havia feriados mesmo que fosse dia de batalha a sério. E chegamos ao Obelisco comemorativo da batalha. Dominando a paisagem, grito de pedra a lembrar aos viajantes o sofrimento inaudito de milhares de homens que ali morreram. O Museu Militar mostra fardas, armas, mapas, gravuras. Porque é preciso manter viva a memória.
Alonga-se a vista na panorâmica soberba da Cruz Alta. Fim, quase, de viagem. Início de uma descida ao coração verde da mata. Veredas, folhas, troncos, cenóbios desabitados. A comunhão com a mãe-natureza. Em nome de todos os deuses. Em memória de todos os homens.


09/04/09

VISITA GUIADA AOS LOCAIS DA 3ª INVASÃO FRANCESA

(Clicar para aumentar)



Estão abertas as inscrições para esta VIAGEM / VISITA GUIADA. Parece-nos uma boa sugestão para dois dias de Primavera...