02/07/08

Texto 11 ( Jornal "BADALADAS", 27 / 06 / 2008




A Batalha de Dois Portos

Venerando Aspra de Matos *

No dia 9 de Outubro de 1810 o exército aliado chegava às Linhas de Torres. Com a chuva caída no dia 7 ou 8, conforme as fontes, encheu-se rapidamente o lado direito do rio Sizandro “tornando-se pelo lado de Torres Vedras n’um formidavel obstaculo defensivo sobre o flanco esquerdo da citada linha, não lhe restando então em toda ella, desde o Oceano até ao Tejo, mais do que um intervallo de duas leguas e meia, (…) não fortificado, ao sul do valle de Runa, entre a villa de Torres Vedras e Monte Agraço”[1].
Entretanto, fustigadas pelo mau tempo, as tropas francesas iam-se aproximando lentamente das Linhas, cuja existência só ficaram a conhecer no dia 11.
No dia 12 marchou a vanguarda do exercito francês para Vila Franca de Xira, “tomando lá as posições que julgou convenientes, distribuindo as tropas pela dita villa, por Povos e Castanheira (…)”, conquistando o Sobral.”Para alem de Runa, a serra do Barregudo e os fortes que se tinham levantado em Torres Vedras não permittiam ao marechal Massena movimento algum de flanco por aquelle lado, não lhe restando portanto mais que a possibilidade de dispor as suas tropas entre Villa Franca e o Sobral (…)”. O “oitavo corpo, cuja frente se achava para diante do Sobral”, ocupou as “menores alturas da citada serra do Barregudo, e” guarneceu “as duas margens do rio Sizandro até “ Dois Portos “sobre a estrada de Runa”.[2]
É na sequência deste posicionamento que tem lugar, em 13 de Outubro, a chamada “batalha de Dois Portos”.
O combate foi travado entre as tropas de um dos postos avançados das Linhas Torres Vedras, e uma “considerável força inimiga”, que, na tarde do dia 13, avançando sobre o mesmo posto, provocou a batalha. Nela participaram, pela parte aliada, duas companhias do regimento n.ºs 11 e 23.[3] Sabe-se que a posição definida para esses regimentos era, respectivamente, a Portela e a Patameira, entre as posições da Ribaldeira e do Sobral.[4]
O registo dessa batalha deve-se à memória anónima de um oficial português que a ela assistiu:
“ (…) fomos de madrugada formar para o outro lado da ponte de Dois Portos, a qual, assim como outra que ha do lado direito, estão já minadas para saltarem em caso de necessidade. Sendo já dia claro [13 de Outubro] retirámo-nos para os quarteis. Pelas duas horas da tarde, tendo-se percebido já que os francezes tentavam algum reconhecimento pelo lado do Sobral, para onde tinhamos as nossas avançadas, principiou-se a ouvir fogo, entre elles e uma avançada ingleza que havia á nossa esquerda: viu-se que um forte corpo de tropas francezas,tomava uma altura junto a um moinho. (…) A poucos minutos principiou o fogo com os nossos, pois que os estrangeiros [ingleses] se tinham retirado; e tanto valor mostravam as nossas tropas, que obrigaram os francezes a desistir da tentativa depois de bem destroçados. (…) Tivemos a sensivel perda do coronel Harvey commandante da brigada, que na acção ficou ferido, a ponto de lhe ser necessario ir tratar de si com todo o cuidado. (…) À noite tornou o inimigo para as suas antigas guardas; nós não baixámos: fizemos saltar as pontes.”.[5]
No dia seguinte ainda se registaram alguns recontros esporádicos à volta do Sobral, chegando nesse mesmo dia o grosso do exército francês.
Depressa os franceses se aperceberam da impossibilidade de se movimentarem mais para sul, lutando desesperadamente contra a falta de mantimentos.
Rotos, esfomeados, acossados pela guerrilha, os franceses comandados por Massena iniciaram a 15 de Novembro a retirada da frente das Linhas de Torres.


* Professor

NOTAS:

[1] Simão José da Luz Soriano, Historia da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal- segunda epocha- guerra peninsular, tomo III, Lisboa, Imprensa Nacional, 1874, pp. 217-218
[2] Simão José da Luz Soriano, Historia da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal- segunda epocha- guerra peninsular, tomo III, Lisboa, Imprensa Nacional, 1874, pp. 236 e 237
[3] Claudio de Chaby, Excertos Historicos e Collecção de Documentos relativos á Guerra Denominada da Peninsula (...), Lx. Imprensa Nacional, 1871, vol.III, pp.237-238
[4] Simão José da Luz Soriano, Historia da Guerra Civil e do Estabelecimento do Governo Parlamentar em Portugal- segunda epocha- guerra peninsular, tomo III, Lisboa, Imprensa Nacional, 1874, p. 222
[5] do diário de um oficial do exército português, iniciado a 31 de Outubro de 1807 e citado por Claudio de Chaby nos Excertos Historicos e Collecção de Documentos relativos á Guerra Denominada da Peninsula (...), Lx. Imprensa Nacional, 1871, vol.III, pp.245-246

3 comentários:

Elsa Martinho disse...

Magnífico espaço!

Um abraço nesta visita.

Rui Prudêncio disse...

Olá Venerando.

Desconhecia a existência da chamada batalha de Dois Portos, o que demonstra o quanto as Linhas de Torres ainda têm para contar, assim como é demonstrativo da minha ignorância, claro.

Tenho "apanhado" muita documentação militar referente às Linhas de Torres no site Infogestnet, que associa vários arquivos digitais na net, onde se encontra o Arquivo Histórico Militar. O endereço é o seguinte:

http://infogestnet.dyndns.info/infogestnet2007/

Entretanto já adicionei este blog (Linhas de Torres) no meu blog,(algo que já devia de ter feito há mais tempo), sob a categoria de Vedrografia, um termo com direitos de autor, uma vez que foste tu que o criaste, e eu o usei sem te pedir autorização, facto de pelo qual peço desde já desculpa.

Um abraço.

ADDPCTV- Associação para a Defesa e Divulgação do Património Cultural de Torres Vedras disse...

Elsa Martinho e
Rui Manuel:

Obrigado pelos comentários.

O Venerando não pode responder aqui porque não administra o blogue. E isto por razões exclusivamente práticas. Mas dar-lhe-emos conta deste comentário, se ele ainda não veio aqui...