12/03/08

Texto 4 (Jornal "BADALADAS", 14/03/2008)

FRANÇA E INGLATERRA EM CONFRONTO

José Travanca Rodrigues *

O projecto napoleónico de afirmação da França, no quadro de uma nova Europa era insustentável, pela dimensão geográfica da empresa e pela multiplicidade dos adversários que tinha de enfrentar.
Não podia deixar de contar com a resistência dos principais estados europeus, que metodicamente contra ele se coligaram. Apesar disso, entre 1802 e 1807, venceu e “confederou” retalhos de uma Alemanha ainda frágil e em busca de um ideal nacional; subordinou um Império Austro-Húngaro vasto mas militarmente frágil; hegemonizou as partículas de que se fazia a Itália, perdida em quezílias internas; atraiu a Espanha a uma aliança anti-britânica e acabou por humilhá-la de modo insuportável para o brio espanhol. Tudo isto era muito, mas Napoleão sabia que os seus propósitos não ficariam completos, se não resolvesse os velhos diferendos que opunham a França à Grã Bretanha.
Os Ingleses eram o “génio funesto” da França.
Nos anos que se seguiram à revolução de 1789, a Inglaterra interviera nas sucessivas coligações anti-francesas. Os antagonismos entre as duas potências não eram problema apenas do espaço europeu. Havia entre elas uma longa querela pela partilha dos crescentes mercados coloniais. Em meados do século XVIII, a chamada Guerra dos 7 Anos (1756/1763) provara já que, só pela força, se dirimiriam os apetites dos contendores. Um breve parêntesis: o resultado de então foi premonitório - a Grã Bretanha passaria a ser a sede de uma nova “economia - mundo”, lugar que deixaria de ocupar apenas no dealbar do século XX, quando o eixo passou o Atlântico, para se fixar nos E.U.A..
Era no mar que Napoleão sabia que o seu inimigo irredutível teria de ser enfrentado, gorada a expectativa, ainda pensada, de uma invasão terrestre. Os resultados do confronto foram, desde logo, funestos para a França. Em Aboukir (1795), ao largo do Egipto, primeiro, e depois no cabo de Trafalgar (1805), não longe da costa algarvia, os Ingleses mostraram sobejamente de que lado estava a supremacia. (Porque será que a praça central de Londres se chama “Trafalgar Square” e no seu centro se ergue a estátua do almirante Horácio Nelson?). Era insuportável para os desígnios britânicos a limitação do seu acesso aos principais portos europeus. Para contrariar as aspirações francesas, os governos britânicos apoiam financeiramente os inimigos de França, sem terem se expor demasiado no plano propriamente militar – é a política resumida na frase: “poucas tropas mas muito dinheiro”.
Liberal, parlamentar e já dotada de uma economia estruturalmente capitalista, a monarquia inglesa teme a França napoleónica, mas espera a sua hora de plena acção. Parece entender que, por maior que seja o brilho das vitórias militares de Napoleão no continente, o ajuste de contas final terá de ser com ela. Reparando bem, a vitória maior de Napoleão terá sido a obtida em Austerlitz, em 1805; ora nesse mesmo ano, os Franceses sabiam já o que os esperaria do lado britânico, pois esse é também o ano de Trafalgar.
Em suma, a luta final teria de obrigar Napoleão a vergar a Grã-Bretanha por outros meios.
Meios que conduziram à intervenção napoleónica na Península Ibérica e às Invasões, cujo bicentenário nestes anos se rememoram. Aqui começaria a empalidecer o brilho, afinal efémero, do prodígio francês.
* Professor

Nota:

Este é já o 4º texto, aqui publicado, sobre o Bicentenário das Invasões Francesas. Tal como no princípio anunciámos (25/01/2008), prosseguiremos ao ritmo de dois artigos por mês. Para os leitores que queiram rever estes textos, e ter acesso a mais informações, foi criado na Internet o blogue LINHAS DE TORRES que pode ser acedido com este endereço:
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